Cultura

Território Livre de Princesa: Um “Estado” no Sertão da Paraíba

Coronel José Pereira e seus homens

Quem sabe que em 1930 um “coronel” latifundiário proclamou a Independência da Cidade de Princesa Isabel-PB, declarando Território Independente, e revoltando-se contra o Governo de João Pessoa?O Território de Princesa ou Território Livre de Princesa foi um território estadual brasileiro de fato, situado na região da Serra do Teixeira, entre as províncias da Paraíba e de Pernambuco, subordinado diretamente ao governo central, situado no Rio de Janeiro.

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O Território Livre de Princesa foi estabelecido em 28 de fevereiro de 1930, nas terras que correspondiam ao município de Princesa Isabel, desmembrado da província da Paraíba, por razões de descontentamento das oligarquias locais em relação ao governo central da província, devido a problemas em relação à cobrança de impostos. A Revolta de Princesa foi um acontecimento que marcou e transformou a vida estadual e teve repercussão nacional.

Tudo teve início através de cizânias políticas e econômicas, envolvendo poderosos coronéis do interior do estado e o governador eleito da Paraíba em 1927, João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque. O principal deles era o chefe político de Princesa Isabel, o “coronel” José Pereira de Lima, detentor do maior prestígio na região, que se tornou o condutor do movimento. Era a própria personificação do poder político. Homem de decisão e coragem pessoal, também era fazendeiro, comerciante, deputado por quatro legislaturase membro da Comissão Executiva do partido.

O “coronel” José Pereira de Lima nasceu em4 dezembro 1884 em Princesa Isabel-PB. Filho de Marcolino Pereira Lima e Águida Andrade de Lima e casado com Alexandrina Pereira Lima .Ingressou i na Faculdade de Direito do Recife, desistiu os estudos em 1905, quando cursava o segundo ano, em virtude do falecimento de seu pai. Assumiu então a chefia política do município de PrincesaIsabel, tornando-se um respeitável “coronel”, o maior da Paraíba e um dos maiores do Nordeste. Seu conceito, segundo Inês Caminha Lopes Rodrigues em A Revolta de Princesa, transcendia os limites municipais, atingindo as esferas estadual e federal.

Em 1915apoiou para Epitácio Pessoa nas eleições para o governo da Paraíba. No âmbito estadual, teve grande atuação, segundo a fonte citada, nos governos de Solon de Lucena (1920-1924) e de João Suassuna (1924-1928), “combatendo hordas de cangaceiros” para o “restabelecimento da ordem pública”. Patrocinador de inúmeras obras públicas no município de Princesa exercia na região uma liderança que lhe garantia a arregimentação de um grande contingente armado. Membro do Partido Republicano da Paraíba (PRP) apoiou em 1928 a candidatura de João Pessoa, lançada por seu partido ao governo do Estado.

À frente do governo estadual, João Pessoa passou a tomar medidas como a modificação da política tributária estadualque contrariavam seus interesses, bem como os de outros coronéis do interior e de grandes comerciantes, como a família Pessoa de Queirós. O governador João Pessoa passou então a sofrer a oposição dos quadros políticos paraibanos tradicionais, seus antigos aliados. O rompimento entre o “ coronel” José Pereira e governador João Pessoa, que a partir de 1929 tornou-se também candidato à vice-presidência da República na chapa da Aliança Liberal, encabeçada por Getúlio Vargas, consumou-se em fevereiro de 1930, motivado por dissensões em torno da apresentação dos candidatos paraibanos à Câmara dos Deputados.

Colocando-se ao lado da chapa indicada pelo governo federal, “ coronel” José Pereira empenhou-se na arregimentação de tropas para dar início a um movimento armado. Com o apoio da poderosa família Pessoa de Queirós, ainda em fevereiro de 1930 deflagrou uma revolta em oposição ao governo estadual de João Pessoa, que ficaria conhecida como a Revolta de Princesa. A revolta teve como personagens principais personagens o governador João Pessoa, o “coronel” José Pereira, advogado João Dantas, ex-governador João Suassuna, membros da família Pessoa de Queirós de Pernambuco, Oscar Soares, Pedro Firmino, o padre Manuel Otaviano, Inácio Evaristo, Cícero Parente, Nilo Feitosa, Duarte Dantas, e o presidente Washington Luís.

O “coronel” José Pereira é descrito como verdadeiro imperador do oeste da Paraíba, na área da fronteira com o estado de Pernambuco. Zé Pereira contava com o apoio dos governadores de Pernambuco e do Rio Grande do Norte, respectivamente Estácio de Albuquerque Coimbra e Juvenal Lamartine de Faria.

O “coronel” José Pereira tinha um contingente de cerca de dois mil homens armados, A Polícia Militar da Paraíba contava com apenas 850 homens egressos das hostes do cangaço e muitos eram desertores da própria polícia paraibana.Os insurgentes contavam com o auxílio em dinheiro e em munições dos membros da família Pessoa de Queirós de Pernambuco e com uma grande quantidade de armas do próprio governo estadual, de gestões anteriores, entregues para enfrentar o bando de Virgulino Ferreira da Silva (Lampião) e a Coluna Prestes.

O Território Livre de Princesa ganhou projeção nacional e internacional. Tinha suas leis próprias, hino, bandeira e jornal próprio (O Jornal de Princeza), moeda, leis própriase Exército. O Decreto nº 1 de 9 de junho de 1930 proclamou provisoriamente a independência do Município de Princesa, separado do Estado da Paraíba. Ficou decretada e proclamada provisoriamente a independência do Município de Princesa, deixando o mesmo de fazer parte do Estado da Paraíba, do qual está separado, desde 28 de fevereiro de 1930.

O decreto foi redigido pelo professor de Direito Internacional da Faculdade de Direito de Recife,Odilon Nestor Barros Ribeiro. Segundo Joaquim Inojosa, no seu livro República de Princesa, a junta governativa chegou a decretar a pena de morte, com fuzilamento sem processo, para aquele que ofendesse (estuprar) moças.

Foi formada uma “Junta governativa” cujos membros eram o “coronel”José Pereira de Lima (chefe dos revoltosos),o prefeito municipal José Frazão Medeiros Lima e o presidente do Conselho Municipal ( Câmara Municipal), Manuel Rodrigues Sinhô. Em 24 de fevereiro de 1930 opresidente João Pessoa, visando desestabilizar o poder de mando do “coronel”, retira (demite) os funcionários do Estado lotados em Princesa Isabel, quase todos parentes e amigos do líder José Pereira, e exonera o prefeito José Frazão de Medeiros Lima, o vice-prefeito Glicério Florentino Diniz, e o adjunto de promotor Manoel Medeiros Lima, indicados pelo chefe político princesense.

Quando o presidente João Pessoa de Albuquerque foi assassinado pelo advogado João Duarte Dantas, de Teixeira, por motivos pessoais/políticos, a força do movimento armado de Princesa se perdeu. No dia 29 de outubro de 1930, a Polícia Militar ocupou a cidade de Princesa Isabelcom trezentos e sessenta soldados comandados pelo Capitão Emerson Benjamim, passando a caçar os que lutaram para defender a cidade ameaçada, humilhando e torturando os que foram presos, sem direito a defesa. A luta teve um balanço final de, aproximadamente, seiscentos mortos.

O Presidente da República, Washington Luiz, decidiu terminar com a Revolta de Princesa e o “coronel” José Pereira não ofereceu resistência, segundo acordo prévio, quando seiscentos soldados do 19º e 21º Batalhão de Caçadores do Exército, ocuparam a cidade em 11 de agosto de 1930. O “coronel” José Pereira deixa a cidade de Princesa Isabel em outubro de 1930. Depois de anistiado, foi residir na fazenda “Abóboras”, situada entre os municípios pernambucanos de Serra Talhada e Triunfo. O caudilho José Pereirafaleceu em 13 de novembro de 1949 em Recife-PE.

Abdias Duque de Abrantesjornalista, servidor público, advogado e pós-graduado em Direito Processual do Trabalho pela Universidade Potiguar (UnP), que integra a LaureateInternationalUniversities

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