O que nos revela para o mundo está muito além do tempo que vivemos e do lugar que habitamos. A nossa ancestralidade atravessa milênios e continentes para universalizar nossa existência. No caso nordestino é fácil perceber. Seja na Cantoria, no Coco de Roda, Embolada, etc.. Mas, principalmente no Aboio. Uma expressão que é o idioma cotidiano do campesino em suas lidas. Algo que migrou de enormes distâncias para os sertões e aqui se fez couro e osso na resistência do povo. Sufocada pela modernidade esta cultura renasce na Paraíba com muita força. Saiu dos campos e das lidas com o gado, para os palcos do já tradicional Festival de Aboio de São José dos Ramos. Hoje este evento é um símbolo da Paraíba no mapa cultural do Brasil.
Experimentei o gosto amargo do que é oferecido para a juventude, recentemente, no “Abril para a Leitura”. Evento do Centro Cultural BNB, em Sousa, no Alto Sertão. Falando sobre leitura para jovens do ensino médio citei Sivuca. Esse mestre da cultura brasileira disse em entrevista que “não existe cultura sem educação”. Perguntei se conheciam Sivuca. A resposta foi a esperada. Não conheciam Sivuca. Então, perguntei se conheciam Aviões do Forró. Mais uma vez a resposta foi a esperada. A turma inteira conhecia. Esta lacuna na identidade cultural explica (e não justifica jamais) a maioria dos problemas vividos hoje pela juventude brasileira.
Não se trata de forjar o gosto do povo. Mas, questionar a padronização desse gosto através da midiatização imposta principalmente aos jovens. A grande mídia está conduzindo gerações e gerações para a exclusão de uma das mais ricas formas de conhecimento: a diversidade cultural. Seria normal que um jovem adorasse Aviões do Forró, Garota Safada ou outra banda do tipo, caso isso fosse uma escolha. Não é uma escolha. Não se trata de “gosto popular” como alardeiam alguns oportunistas patológicos e políticos espertos. Esta midiatização do gosto é um crime contra a juventude, pois exclui o direito de escolha. Apenas impõe os modelos inventados pela indústria do entretenimento. Sufoca a oportunidade de um jovem construir sua vida a partir do reconhecimento da sua origem.
Veja um aboio dolente de Zé do Cambaio
_________________
Lau Siqueira é gaúcho de Jaguarão-RS e reside há mais de vinte e cinco anos na Paraíba. É poeta e escritor. Escreve artigos sobre literatura, arte, cultura e políticas públicas. Publicou cinco livros e participou de várias antologias e coletâneas de repercussão regional e nacional.
Paraíba Já