Padre, vá cuidar das coisas de Deus!

Há um bom tempo que venho recebendo, através das redes sociais, enxurradas de mensagens superficiais, sem pé e cabeça. São postagens críticas, às vezes de mau gosto, com tom de ira, de revolta, de deboche. Essas opiniões são desprovidas de fundamentos bíblico-teológicos, numa categórica demonstração que essas pessoas não têm noção exata do que estão escrevendo ou falando. Para esses críticos, só resta tentar imitar Jesus: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que dizem” (Lc, 23,34).

- PUBLICIDADE -

O que me deixa triste é saber que em pleno século XXl, ainda há pessoas que têm uma concepção medievalesca e muito limitada da missão do padre , quer na Igreja, na sociedade, no mundo da política, da economia, da ciência, da cultura etc. Para essa gente de compreensão unilateral, alienante, retrógrada, o padre não passa de um ser angelical, a-histórico, vivendo n mundo meramente espiritual, quase como um semideus. Um ser distante de tudo e de todos, que não pode imiscuir-se na realidade histórica. Trata-se, indubitavelmente, de uma verdadeira alienação religiosa.

Vejam o que muitos postam nas redes sociais sobre o a missão do padre. São postagens que têm como objetivo impedir que o sacerdote assuma verdadeiramente uma evangelização profética, promovedora, libertadora, visando a construção do Reino de Deus, no aqui e no agora da história , tendo sua plenitude na escatologia, assim como fizera Jesus: Jesus : “Os cegos enxergam, os mancos caminham, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados, e aos pobres é anunciado o Evangelho”(11,15):

-Padre Djacy, o senhor como padre deveria estar cuidando das coisas de Deus e da Igreja (Não sei se se trata de igreja templo ou Igreja povo de Deus).

-Lugar de padre é na igreja, rezando, louvando, celebrando e cuidando das coisas de Deus.

-Padre é só para rezar e louvar.

-O padre não pode falar de política.

-Padre que fala em politica, em justiça social, em terra, em moradia, em água, em emprego, está na contramão da santa Madre Igreja.

-Vá rezar, padre, é melhor do que o senhor está falando em libertação, em justiça. Seu lugar é na igreja.

-Padre é só para viver rezando. Esse negócio de padre está brigando por libertação do povo não combina.

-Eu não acredito em padre que vive falando em Teologia da Libertação.

-Padre é pra estar de batina, com a bíblica na mão, rezando sem parar.

-Esse padre só fala em pobre, em fome, em sede, em miséria. Esse padre está na contramão da Igreja Apostólica romana.

_Padre, pare de falar em libertação, deixe isso para os políticos.

-Padre, não se envolva em politica.

-Eu não assisto a missa desse padre, porque só fala em pobre, em terra, em água, em politica.

Cuidar das coisas de Deus? E o que são as coisas de Deus? E onde estão as coisas de Deus? Diria que são muitas as coisas de Deus, como a vida humana, o cosmo, o ar que respiramos, os rios, os mares, as árvores, os animais etc. Então, na minha concepção, cuidar das coisas de Deus, é cuidar de tudo isso, é cuidar da dessas coisas criadas por Deus. Não é verdade? Aliás, recomendaria a leitura do livro do Gênese 1, onde Deus cria tudo com amor e por amor e dá ordem ao homem para cuidar da criação.

Mas, afinal, qual a coisa mais preciosa aos olhos de Deus? O que Deus mais admira? Para onde se dirige o seu amor predileto? Claro que é a pessoa humana, que é imagem e semelhança sua: “E criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” (Gênesis 1:27). Então, quando o padre luta para que toda pessoa humana seja tratada com respeito, dignidade, tenha vida digna, está cuidando com carinho dessa coisa abençoada de Deus; quando luta para que a pessoa humana tenha casa para morar, emprego, salário justo, educação de qualidade, terra para trabalhar, atendimento médico-hospitalar humanitário e de qualidade, então está cuidando dessa preciosa coisa de Deus. Enfim, libertar os pobres do cativeiro da fome, da miséria, da injustiça social e de todo tipo de exclusão, como também cuidar do meio ambiente, é, sem dúvida, cuidar das coisas de Deus.

Cuidar das coisas de Deus, não é cuidar de templo tijolo, de caixa de som da igreja, das vestes sagradas, do sino, dos bancos da igreja (Até que isso é necessário, no sentido de conservar, preservar, mas não é o essencial da missão do padre), mas cuidar do meio ambiente e dos filhos e filhas de Deus que clamam por justiça, dignidade, vida.

Também queria explicar uma questão bem pertinente quanto à dimensão politica.

Ora, quando o padre luta por água, por emprego, por segurança, reforma agrária, salário justo para os trabalhadores etc., então está fazendo política com P maiúsculo, e não politicagem. Lutar por vida, justiça, dignidade, é fazer Politica na sua mais nobre concepção, como diz o Papa Francisco: “Devemos envolver-nos na política, porque a política é uma das formas mais altas da caridade, porque procura o bem comum”. Então, irei continuar fazendo Politica, visando tão somente o bem-estar e a felicidade do povo de Deus, neste pedaço de chão nordestino.

Uma palavra sobre a missão do padre na Igreja

Como é notório, a Igreja é o povo Deus, e onde está o povo, aí deve estar o padre para servi-lo, ajudá-lo, ouvir seus clamores e libertá-lo profeticamente do cativeiro da exclusão, das injustiças, da opressão etc. Assim como fizera Jesus de Nazaré: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Javé me ungiu; enviou-me a anunciar a boa nova aos pobres, a curar os quebrantados de coração e proclamar a liberdade aos cativos, a libertação aos que estão presos …”(Isaias, 61,1-2).

Aliás, Jesus passou a vida no meio do povo, libertando-o, curando-o, amando-o. Na sua paixão pelos filhos e filhas de Deus, ele gritara: “eu vim para que todos tenham vida”. Então, Jesus foi aquele que melhor cuidara da coisa mais preciosa aos olhos de Deus: o ser humano. Então, lugar de padre é na Igreja mesmo, isto é, no meio do povo, caminhando com povo, lutando com o povo, vivendo e morrendo com o povo de Deus.

A seguir, o profeta Isaias nos mostrar que libertar o povo pobre, oprimido, é algo que agrada a muitíssimo a Deus pai:
“Sabeis qual é o jejum que aprecio? – diz o Senhor Deus: é romper as cadeias injustas, desatar as cordas do jugo, mandar embora livre os oprimidos e quebrar toda espécie de julgo. É repartir seu alimento com o esfaimado, dar abrigo aos infelizes sem asilo vestir os maltrapilhos, em lugar de desviar-se de seu semelhante…”(Isaias, 58, 6-8).

O Papa Francisco foi profeta, enfático, verdadeiro, quando disse:

“É melhor ser ateu do que um católico hipócrita!”

Espero que tenha respondido aos meus críticos de forma caridosa, humilde e contundente.

Padre Djacy Brasileiro