Quem é o meu inimigo?
Um político divide os seres humanos em duas classes: instrumentos e inimigos. (Friedrich Nietzsche)
No temeroso Brasil de hoje as classes sociais são determinadas não mais pelo poder aquisitivo, ou indicadores qualitativos, em tempos sombrios como os atuais, a sociedade está estratificada pelo capital social (o poder de investimento financeiro de cada um) e pelo controle do imaginário que cada um pode exercer sobre o outro. Este controle das ideações e dos pensamentos das pessoas é moeda corrente a qual o trabalhador não tem acesso, mas é onde os seus interesses são negociados.
O que assistimos no cotidiano brasileiro é a ameaça letal à independência dos pensamentos das pessoas. Por mais absurdo que pareça, a alienação dos discursos é fato e os brasileiros não se aperceberam disso. Hoje é trabalhador contra trabalhador, assalariado contra assalariado, pobre contra pobre, desempregado contra desempregado e a mídia surrupiando a todos da realidade.
Não há uma radicalização do povo contra as mazelas de um governo maldito, porém a ovação de uma disputa insana de um povo contra si mesmo é gritante. A mídia descompromissada nos colocou uns contra os outros. Não sondamos o futuro da nação, não lutamos pela fuga da masmorra social em que fomos alocados. Lutamos em defesa da condição em que a bestialização midiática do país nos ofereceu como bandeira de guerra.
Quando Sergio Buarque de Holanda, em “Raízes do Brasil”, nos catalogou como cordiais e pacíficos certamente não imaginava os patamares a que esses adjetivos nos elevariam. A acomodação ante o desastre chega a enrubescer. Cordialidade e pacifismo não são sinônimos de acomodação, ignorância, muito menos de conivência.
Assistimos e damos suporte a uma pauta que em nada (absolutamente em nada!) representa os anseios da classe trabalhadora. As centrais sindicais suplicam por uma exumação, mas os nossos sentidos estão embriagados do ódio de nós para conosco. A forma como as classes hoje se enxergam são reclames exacerbados de uma dominação do imaginário popular, condicionada à violência e ao auto desconhecimento.
Distinguimos os lados pela odiosidade que nutrem um contra o outro. E nesse lamaçal, trabalhador defende patrão, explorado aplaude explorador, pobre odeia pobre e os dominadores se refestelam da nossa desgraça.
As elites conseguiram, agora mais do que nunca, ter o absoluto controle das nossas aspirações. Não queremos o melhor para o país, nem para nós próprios. Guerreamos pela vitória do ódio e do rancor sobre o que um dia foi um país “abençoado por Deus e bonito por natureza”. Estamos sendo midiaticamente condicionados a esquecermo-nos de nós e do que queremos para nossa pátria. Não nos reconhecemos brasileiros, tampouco identificamos nossos inimigos com a exigida racionalidade.
A sabedoria de Sun Tzu, em “A Arte da Guerra”, nos remete a refletir sobre quem somos e contra quem devemos lutar: – “Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas. Se você se conhece, mas não conhece o inimigo, para cada vitória ganha sofrerá também uma derrota. Se você não conhece nem o inimigo nem a si mesmo, perderá todas as batalhas.” A nossa ignorância da realidade – somada a servidão voluntária – nos reserva ao calabouço da vergonha histórica.
Se para Karl Marx, “a história da sociedade até aos nossos dias é a história da luta de classes”. Para os nossos filhos, doravante, a história da sociedade brasileira passa a ser a história do ódio entre classes. Somos ódio vivo pulsando uns contra os outros.
Brasileiros e brasileiras, estamos momentaneamente cegos. Estão nos conduzindo pelo caminho tenebroso da antropofagia social. Nesse momento não temos o que comemorar. O banquete posto é para as elites e os convidados são os donos da Casa Grande.
FRANCISCO JARISMAR DE OLIVEIRA (Mazinho)
Licenciado em História pela UFPB
Servidor Público Federal do IFPB