Mudanças climáticas: uma ameaça real ao Planeta Terra e todas as suas espécies
“A justiça ecológica significa: o ser humano tem uma dívida de justiça para com a Terra. A Terra possui sua subjetividade, sua dignidade, sua alteridade, seus direitos. Ela existiu há milhões de anos, antes que surgisse o ser humano. Ela tem direito a continuar a existir em sua complexidade, com seu patrimônio genético, com seu bem comum, com seu equilíbrio e com as possibilidades de continuar a evoluir”. (Leonardo Boof)
No mundo contemporâneo, acima de tudo nas últimas quatro décadas, estamos claramente envoltos com as denominadas mudanças climáticas, um dos fenômenos mais complexos, impactantes, desafiadores e críticos para o Planeta Terra e história da humanidade. A Terra e a totalidade de suas espécies, de modo evolutivo, no Século XXI, vem sendo afetada pelas mudanças climáticas em todos os continentes.
É inegável também, que na vigente sociedade há inúmeras práticas econômicas e investimentos financeiros potencialmente predatórios dos recursos naturais, tornando-os em inúmeros lugares, cada vez mais escassos. Modos ou formas acentuadas de irracional ou desordenado consumo, acima de tudo no contexto dos países capitalistas desenvolvidos, revelam-se como fator agravante para a produção e expansão do fenômeno citado.
Compreende-se que já existem em várias regiões do mundo atual, escassez crescente de petróleo, gás natural, bem como de água potável, essencial recurso para a sobrevivência de milhões de espécies, tanto da flora quanto da fauna, e obviamente de todos os seres humanos. Acresce-se a tal problema, uma progressiva perda da biodiversidade em várias regiões do mundo, inclusive no Brasil, em seus principais biomas.
O desaparecimento dos recursos naturais avança em função das macro explorações produzidas pelas empresas multinacionais e transnacionais; potências econômicas mundiais; e até países em desenvolvimento e subdesenvolvidos. Todos esses ”atores” estão contribuindo para o desaparecimento de recursos naturais e a destruição do meio ambiente, com implicações negativas para a maioria da população mundial.
O aumento considerável das emissões de gases de efeito estufa resultante, acima de tudo, da queima desordenada e evolutiva de combustíveis fósseis, reforçados por criminosos processos de desmatamento, estão alterando de modo significativo o clima, advindo com isso várias consequências: aumento da temperatura em várias regiões do planeta; crescimento do despendimento das calotas de gelo na Antártida e Polo Norte, com consequente aumento do volume d’agua dos oceanos; incidência acentuada de chuvas torrenciais em lugares onde não ocorria tal fenômeno, além da produção de estiagem e aumento da desertificação em outros; progressivo desaparecimento de várias espécies vegetais e animais.
Diante do exposto, há, pois, uma corresponsabilidade de milhares de seres humanos com a produção das situações e condições que provocam na atualidade alterações negativas graves, e cada vez mais amplas no clima do Planeta Terra.
Conforme o Papa Francisco, abordando o cuidado da causa comum na Carta Encíclica Laudato Si’, com muita propriedade e elevado senso de compromisso e responsabilidade com o Planeta Terra e a humanidade, deixa evidente que:
As mudanças climáticas são um problema global com graves implicações ambientais, sociais, económicas, distributivas e políticas, constituindo actualmente um dos principais desafios para a humanidade. Provavelmente os impactos mais sérios recairão, nas próximas décadas, sobre os países em vias de desenvolvimento. Muitos pobres vivem em lugares particularmente afectados por fenómenos relacionados com o aquecimento, e os seus meios de subsistência dependem fortemente das reservas naturais e dos chamados serviços do ecossistema como a agricultura, a pesca e os recursos florestais. Não possuem outras disponibilidades económicas nem outros recursos que lhes permitam adaptar-se aos impactos climáticos ou enfrentar situações catastróficas, e gozam de reduzido acesso a serviços sociais e de protecção. Por exemplo, as mudanças climáticas dão origem a migrações de animais e vegetais que nem sempre conseguem adaptar-se; e isto, por sua vez, afecta os recursos produtivos dos mais pobres, que são forçados também a emigrar com grande incerteza quanto ao futuro da sua vida e dos seus filhos. É trágico o aumento de emigrantes em fuga da miséria agravada pela degradação ambiental, que, não sendo reconhecidos como refugiados nas convenções internacionais, carregam o peso da sua vida abandonada sem qualquer tutela normativa. Infelizmente, verifica-se uma indiferença geral perante estas tragédias, que estão acontecendo agora mesmo em diferentes partes do mundo. A falta de reacções diante destes dramas dos nossos irmãos e irmãs é um sinal da perda do sentido de responsabilidade pelos nossos semelhantes, sobre o qual se funda toda a sociedade civil.
As concepções do Santo Padre, expressas anteriormente, demonstram claramente a gravidade das mudanças climáticas enquanto problema global. A exigir, inclusive, desenvolvimento de ações concretas para o seu enfrentamento, realizadas por estados, governos, empresas, e sociedade civil organizada de todo o planeta. Sem a conjugação, pactuação, governaça efetiva, ampla e verdadeira das mudanças climáticas, tanto as suas causas como suas consequências, tenderão a evoluirem, independente das avassaladoras práticas difusoras do negacionismo sobre tal questão.
“As mudanças climáticas induzidas pelo ser humano estão causando perturbações perigosas e generalizadas na natureza e afetando a vida de bilhões de pessoas em todo o mundo, apesar dos esforços para reduzir. Pessoas e ecossistemas menos capazes de lidar com isso estão sendo os mais atingidos, afirmaram cientistas no último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) – Mudança climática 2022: impactos, adaptação e vulnerabilidade”, documento de extraordinário valor, o qual recomendo que leitores deste modesto artigo façam sua leitura sistemática.
O que é o efeito estufa, aquecimento global e mudanças climáticas
Nos alicerçamos em TILIO NETO (2010, apud GADELHA, 2020, p. 20) para, didaticamente, assegurar aos leitores deste texto uma compreensão clara, segura e atual sobre o que é o efeito estufa, o aquecimento global e as mudanças climáticas, assim evidenciadas:
Efeito estufa se refere ao aumento da concentração de determinados gases na atmosfera – os chamados gases de efeito estufa (GEEs). Altas concentrações de GEEs fazem com que a temperatura global se eleve, mas também podem ter outros efeitos complexos, dependendo dos gases envolvidos. Os clorofluorcarbonos (CFCs), por exemplo, têm grande capacidade de gerar efeito estufa, mas também refletem a radiação solar, ajudando a resfriar o planeta. Por aquecimento global entende-se a elevação da temperatura média da Terra. Algumas de suas causas possíveis são o efeito estufa e o aumento da atividade solar. O aquecimento global pode gerar epidemias de doenças tropicais, afetar os padrões das chuvas e o equilíbrio entre as estações do ano. Dentre outros impactos, pode afetar o próprio clima da Terra. Mudanças climáticas são justamente alterações no sistema climático terrestre, que podem advir do aquecimento global, de alterações na circulação oceânica ou de outros fatores.(TILIO NETO, 2010, p. 30-39 apudGADELHA, 2020, p. 20).
Por sua vez, o conceituado geógrafo ADAS (1998, p. 342), abordando a biosfera e os climas do Brasil, deixa claro, com bastante pertinência que:
As mudanças interferem, significativamente, nas alterações dos diversos planos da geosfera. Ao romper com a sensível rede de interações da biosfera, da atmosfera e da litosfera, e destas entre si, o ser humano está causando a destruição do seu planeta. E a Terra é um planeta com condições específicas: no decorrer de sua história geoecológica as condições favoráveis para o desenvolvimento da vida aqui surgiram e persistiram. Difere, portanto, de outros planetas vizinhos. […] O clima é, sem dúvida alguma, a expressão dos grandes domínios interativos da geosfera. Sua importância é tão grande para tudo o que existe na Terra que ele foi considerado patrimônio comum da humanidade, por decisão tomada na ONU em 1989.
Através de tal formulação, ficam explícitas as correalções profundas e permanentes entre a existência das múltiplas formas de vida existentes na Terra e o clima. Neste sentido, também fica evidente que a manutenção da exploração irracional dos recursos naturais; processo de industrialização emissor de toneladas de CO2na atmosfera; urbanização desordenada; destruição crescente de solos, com uso indiscriminado de agrotóxicos; práticas de consumo insustentáveis; geração de incêndios florestais; crescimento da poluição nos oceanos; entre outros componentes similares, são provocadores de mudanças climáticas e, obviamente, de extremos climáticos, se fazendo, portanto, necessário que nos reconectemos com a Mãe Terra, de maneira harmoniosa, resiliente, respeitosa, ética e sustentável.
Globalização X mudanças climáticas
O vigente processo de globalização, realizado na perspectiva neoliberal, tem agravado substancialmente as disparidades econômicas e financeiras entre o Norte Desenvolvido e o Sul Pobre; aumento da concentração de renda e riqueza em mãos de multimilionários, que inclusive na atualidade se dão ao requinte de construir empresas e naves para brincar de promover turismo espacial, enquanto expressiva parcela da humanidade afunda na probreza e miséria absoluta. Um verdadeiro escárnio!
Essa ordem econômica, política e social, caracterizada pela globalização, propicia a exploração desordenada de recursos naturais em várias regiões do mundo, para responder à demandas de consumo não menos danosas ou nefastas ao meio ambiente, principalmente dentro das civilizações ocidentais mais desenvolvidas. Os arautos, gerenciadores e acumuladores de trilhões de dólares e euros, com tais práticas, não manifestam-se até aqui, concretamente, com responsabilidade tranparente no que se refere a contenção do efeito estufa, aquecimento global, e mudanças climáticas. Muito menos, com ações de desenvolvimento sustentável que subvertam ou alterem, significativamente, a perversa lógica de dominação e exploração do sistema capitalista vigente.
Principais consequências das mudanças climáticas na atualidade
São inúmeras as consequências das mudanças climáticas para a Terra, suas múltiplas espécies e, principalmente para todos os seres humanos. Dentre as quais, enumera-se: secas intensas; aumento da escassez de água potável em várias regiões do mundo; crescente surgimento e propagação de incêndios florestais; aumento do nível do mar, já impactando algumas metrópoles e cidades de porte médio; aumento da frequência dos furacões, como tem acontecido neste ano nos Estados Unidos, Europa e países asiáticos; crescimento das ondas de calor; derretimento progressivo das geleiras do Ártico; fragilização e declínio da biodiversidade; comprometimento do funcionamento de sistemas de energia, transporte, saúde e segurança, em algumas regiões do planeta; eclosão de inundações e tempestades; entre outras.
Algumas alternativas possíveis que vêm sendo construídas para o enfrentamento e mitigação dos extremos climáticos, contemplam aspectos que podem assim ser destacados:
- Considera-se ser indispensável a mudança no modelo de desenvolvimento econômico vigente, não apenas do Brasil como no mundo;
- Necessário de se faz ainda que a comunidade internacional, através dos seus estados, governos, principais instituições, cumpram e façam cumprir a meta de emissão de gases que provocam o efeito estufa em 7% ao ano;
- Os países desenvolvidos precisam reduzir o consumo de suas populações, pararem seus investimentos de trilhões de dólares e euros em suas indústrias bélicas, reais máquinas de guerras e mortes, e procurarem colaborar, urgentemente, com os países em desenvolvimento e subdesenvolvidos para construção de situações e condições ensejadoras de conservação sustentável dos recursos naturais, com consequente expansão da defesa, proteção e preservação do meio ambiente, assegurando o hoje, o amanhã, e o futuro da Terra e humanidade;
- A estabilidade climática do planeta, para as presentes e futuras gerações, a produção e realização de congressos e conferências nacionais e internacionais, e assinatura de tratados ambientais;
- Avança também a sistematização e democratização das legislações ambientais em vários recantos do planeta, os processos de mobilização contra as causas produtoras das mudanças climáticas, e as pesquisas sobre tal temática são intensificadas também no Brasil, de modo correto e promissor.
Todos nós somos responsáveis e devemos cada vez mais nos responsabilizarmos pelas diversas lutas, estratégias intervenções, conferências, fóruns ambientais, ações pedagógicas que sejam promotoras da anti-devastação ambiental. A destruição ambiental atual é profundamente desumanizadora e atentatória a existência humana e seus direitos, em várias regiões do planeta. Toda agressão, poluição, exploração irracionale destrutiva do meio ambiente impacta rápida e amplamente a vida do ser humano. A Mãe Terra e sua extraordinária biodiversidade, constitui-se em mãe fantástica! Todavia, na medida que vem sendo maltratada, converte-se e converter-se-á, cada vez mais, em madrasta perversa. Não há como mais adiar o efetivo reconhecimento dos direitos da natureza, incluindo tão importante fundamento jurídico, político e social na legislação ambiental brasileira e mundial.
Outro compronente essencial ainda, é levarmos em profunda, inadiável e real consideração todo o patrimônio sócio-histórico-cultural das civilizações indígenas, dos povos e comunidades quilombolas, e de nossos irmãos sertanejos, situados em todas as regiões do semiárido nordestino (suas vivências, adaptações às adversidades, processos de convivência com a natureza, a pluralidade de seus conhecimentos e saberes, e seus modos e formas de práticas sociais de boa e sustentável convivência com o meio ambiente). Tais setores, historicamente, têm nos dado provas, com suas práticas sociais, de significativa importância, validade, e utilidade em suas relações com a natureza, nos locais em que estão situados. Tal realidade, de algum modo, está explicitada em obras relevantes de cientistas como Darcy Ribeiro, Josué de Castro, entre outros.
É inadiável ainda que o Estado Brasileiro, através do Governo Federal, realize enquanto política de estado, maiores investimentos para o desenvolvimento científico e tecnológico do País e também para maior, eficente, eficaz e ampla defesa, proteção e preservação do meio ambiente, em todo o território brasileiro. “A boiada” não pode passar impunemente, como preconizava o ex-dublê de ministro do Meio Ambiente do governo bolsonarista. Pelo contrário, é fundamental que todos os pressupostos, princípios, fundamentos do Estado Democrático de Direito, e da Constituição da República Federativa do Brasil vigente, sejam efetivamente cumpridos, na sua integralidade.
Considerações finais
É inegável que parcela significativa da comunidade científica, nacional e internacional, continua empenhada no aprofundamento das pesquisas sobre as causas, consequências e construção de alternativas que envolvem as mudanças climáticas no Século XXI. Tal trajetória é feita de modo multiprofissional e interdisciplinar, e tal fato é de grande relevância para salvaguardar nosso planeta e a sobrevivência de todas as suas espécies, e demais recursos. Compreende-se ainda, que a presente crise climática caracterizará a agenda ambiental de 2022 no mundo, havendo perspectiva da organização, desenvolvimento e desdobramentos das pactuações efetivadas no âmbito de eventos como a COP 26, por exemplo, acordos de cooperações e assinaturas de tratados internacionais no campo ambiental. Para além desses componentes, inúmeros fóruns, conferências, convenções relativas às mudanças climáticas serão realizadas no transcurso do presente ano. E isso, além de significativo, é bastante promissor para o Planeta Terra e a humanidade.
Para os leitores interessados no aprofundamento de tal temática, sugere-se que seja acessado, possivelmente:
Fórum Ipea de Mudanças Climáticas
https://www.ipea.gov.br/mudancaclimatica
Fórum Clima – Instituto Ethos
Mudanças climáticas, ciência e sociedade
Mudança do clima no Brasil
A COP 26 explicada
Grupo de Pesquisa em Mudanças Climáticas
http://mudancasclimaticas.cptec.inpe.br
A economia da mudança climática na América Latina e no Caribe
https://repositorio.cepal.org/bitstream/handle/11362/44486/1/S1801217_pt.pdf
Sexto Relatório de Avaliação do IPCC: Mudança Climática 2022 https://www.unep.org/pt-br/resources/relatorios/sexto-relatorio-de-avaliacao-do-ipcc-mudanca-climatica-2022
Proposta do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas para o Plano de Ação Nacional de Enfrentamento das Mudanças Climáticas https://is.gd/qRUzJL
Vulnerabilidade socioambiental dos moradores do estuário do Rio Paraíba- PB frente as mudanças climáticas e variações do nível do mar https://is.gd/BbwFMl
Impactos das mudanças climáticas: o recado do novo relatório do IPCC para o Brasil https://is.gd/FQklU3
Referências
ADAS, Melhem. Panorama geográfico do Brasil: contradições, impasses e desafios socioespaciais. 3ª ed. São Paulo: Moderna, 1998, p. 342.
BOFF, Leonardo. Ética da vida: a nova centralidade. Rio de Janeiro: Record, 2009, p. 37.
FRANCISCO, Papa. Carta Encíclica Laudato Si’ sobre o cuidado da casa comum. Disponível em: is.gd/AHPCE0Acesso em: 24/04/2022.
GADELHA, Denise Pinto. Mudanças climáticas e vulnerabilidade em comunidades rurais : indicadores e índice para pequenas localidades. João Pessoa: UFPB, 2020. Disponível em: is.gd/LjqCj9 Acesso em: 24/04/2022.
Por: Giovanny de Sousa Lima